
O triunfo do conteúdo no Marketing de quarentena
A incerteza que abalou a sociedade desde o início da epidemia já chegou aos mercados. Com especialistas a anunciarem a inevitabilidade de uma recessão económica global, as empresas já começaram a apertar o cinto e os departamentos de Marketing não estão a salvo dos cortes orçamentais.
Para já, a primeira defesa é o reajuste: as estratégias planeadas e aprovadas para este ano têm de ser revistas. Será necessária uma redistribuição de verbas, um combate implacável ao desperdício e – porque esta não será uma crise de um mês – uma reorientação do foco para campanhas lucrativas no longo prazo em detrimento dos ganhos imediatos. E aqui brilha o conteúdo.
Metade das campanhas, o dobro do conteúdo
O conteúdo é a melhor aposta que os marketers podem fazer em tempo de contenção do mercado. Ainda que exigente do ponto de vista do investimento inicial, é uma fonte permanente de tráfego e, no longo prazo, compensa mais do que as tradicionais campanhas pagas.
Contas em cima da mesa, olhemos para as campanhas tradicionais. O investimento, embora adaptável à capacidade da empresa, gera resultados proporcionais ao montante dedicado e durante um período fixo de atribuição. Para continuar a obter resultados depois desse período é necessário renovar a campanha e fazer novo investimento.
Em números: um investimento de 100 euros numa campanha de paid media pode render mil visitas numa semana, mas serão necessários mais 100 euros para continuar a trazer tráfego na semana seguinte.
Em contraste, uma boa peça de conteúdo pode gerar resultados infinitos. É o que Tomasz Tunguz chama de “capitalização do retorno”: o conteúdo rende tráfego quando é difundido, mas mantém-se ativo muito depois desse momento. Bem otimizado, continua a posicionar-se organicamente e a gerar tráfego sem requerer investimento adicional.
Novamente em números: uma peça de conteúdo que custe os mesmos 100 euros pode render um pico de apenas quinhentas visitas, só que esse pico de tráfego é seguido de uma corrente infinita de partilhas, comentários, pesquisas e visitas orgânicas. A longo prazo, o valor do retorno ultrapassa os 100 euros investidos e o conteúdo transforma-se numa fonte de rendimento permanente e gratuita, capaz de gerar visitas e leads.
Lembro-me, a este propósito, que o Ekonomista tem um exemplo perfeito de conteúdo com rentabilidade infinita. É um artigo sobre o código do trabalho, publicado pela primeira vez em janeiro de 2016, e que ainda hoje ocupa os lugares cimeiros no Analytics e já gerou mais de mais de um milhão de visitas.
Claro que o conteúdo foi sendo atualizado com regularidade, mas o retorno já ultrapassou de tal forma o investimento que, neste momento, aquele artigo já paga a produção de outras peças. Conseguir, com campanhas pagas, um ROI que torna o negócio auto-suficiente e dispensa o investimento? Difícil. Muito difícil.
Depois há a questão da aposta em conteúdos temporais. Em tempo de pandemia, é fácil prever que artigos sobre o novo coronavírus têm sucesso garantido. Foi outra oportunidade que o Ekonomista soube aproveitar: um artigo simples sobre cuidados a ter na ida ao supermercado já gerou mais de 200 mil visitas ao site e promete continuar a contribuir para as estatísticas nas próximas semanas. Não consigo imaginar uma campanha a disparar os números desta forma – a menos, claro, que o investimento fosse igualmente grandioso.
Em época de orçamentos magros, o conteúdo é claramente um investimento no futuro, com resultados mais consistentes e sustentáveis.
Os conteúdos são a aposta mais segura neste momento porque:
1. Todos os temas são bons temas
A quarentena generalizada em quase todos os países desenvolvidos – que são também aqueles onde a penetração da internet é maior – potenciou a procura generalizada de conteúdos online. Pesquisas recentes mostram que a atenção dedicada aos conteúdos digitais subiu 39% e, o que é mais curioso, não há temas nem tipologias que se destaquem particularmente.
A explicação pode estar, precisamente, no facto de os utilizadores passarem o dia em casa: o consumo de conteúdos em intervalos tão grandes de tempo acaba por ser variado nos temas e nos propósitos (entretenimento, produtividade, estudo,…).
2. O conteúdo temporal também é intemporal
A incerteza que assola as comunidades, acompanhada de uma confusão geral e da circulação de informações contraditórias, fez disparar as pesquisas relacionadas com a pandemia em todo o mundo. Para os marketers, este é o farol a seguir: quando a audiência faz perguntas, sai vitorioso quem oferecer as melhores respostas.
Aplicando-se as habituais normas de diferenciação, é importante que os profissionais se mantenham atentos ao seu público-alvo e respondam a questões específicas de cada setor. O objetivo é que os conteúdos sejam oportunos, credíveis e úteis, mas, sobretudo, que sejam exatamente o que determinado segmento do público procura.
Importante também é lembrar que a dinâmica de geração eterna de resultados também se aplica aos conteúdos temporais: mesmo depois de a pandemia passar, é difícil que bons conteúdos percam relevância, porque vão estar associados a palavras-chave valorizadas (desinfeção, trabalho remoto, gestão financeira,…). Assim, o investimento em conteúdos adaptados à atualidade traz um duplo benefício: o valor reforçado durante a pandemia e os resultados que perduram a longo prazo.
3. O conteúdo salva o orçamento
Os eventos e a publicidade tendem a absorver grandes percentagens dos orçamentos de Marketing – e são precisamente estas alíneas que “morrem” quando a economia se contrai e os consumidores se fecham em casa.
Realocar as verbas no marketing de conteúdo é garantir que o retorno não se perde. Ainda que a forma da rentabilidade mude e se estenda mais no tempo, ela mantém-se quando o conteúdo gerar resultados no longo prazo e compensar o investimento inicial.
Além disso, o conteúdo constrói e reforça relações de confiança e credibilidade entre as marcas e os consumidores – resultado que permitirá aos negócios partir em vantagem quando a economia recuperar e os consumidores voltarem às lojas. Se o conteúdo publicado agora se traduzir em maior volume de vendas no futuro, temos um retorno financeiro tão ou mais mensurável que o dos eventos ou campanhas previstos no início do ano.
4. O conteúdo gera eventos
Impedidas de organizar eventos físicos, as marcas não ficam de mãos atadas. Os eventos virtuais são uma possibilidade real e as tecnologias que os possibilitam estão largamente acessíveis. Webinars, debates, entrevistas, concertos, apresentações… tudo é possível desde que haja ligação à internet.
O conteúdo pode, por um lado, permitir aos marketers identificar temas de potencial interesse entre o público-alvo (o bom desempenho de uma peça nas redes sociais, por exemplo, é preditor do sucesso de um evento sobre o mesmo tema). Por outro lado, pode construir o contexto que torna determinados eventos virtuais relevantes, fornecendo informação e despoletando interesse entre os utilizadores.
Neste ponto, é importante salientar que, ao contrário do que acontecia até aqui, as marcas não dispõem de ferramentas para “compensar” más experiências. Tendo a internet como única plataforma de consumo, é essencial que seja estabelecida uma harmonia perfeita entre os eventos e os conteúdos online, porque é neles que vai basear-se a experiência do cliente. Aqui, qualidade é sobrevivência.
Neste contexto, o investimento em conteúdo assume várias vantagens: além do retorno esperado, permite um planeamento fundamentado dos eventos e até a construção de uma narrativa completa que acrescenta valor à marca a cada novo elemento adicionado.
O dobro dos conteúdos, o triplo das histórias
Em momentos de insegurança e isolamento, os consumidores valorizam narrativas que alimentem o sentimento de união e de pertença. Estas narrativas constroem-se através de histórias que assentam em elementos comuns.
É importante, mais do que nunca, que as marcas sejam sensíveis à vulnerabilidade coletiva. A identificação com a audiência passa pela partilha emocional, pela ligação afetiva, pela construção de narrativas em que cada consumidor se revê. Em poucas palavras, é tempo de as marcas fazerem o bem e espalharem o bem. Com conteúdos relevantes, de qualidade, oportunos e empáticos. Solidários e colaborativos com um mundo que se une para ultrapassar a dificuldade.
Todos nós precisamos de um senso de dever e propósito agora. E a melhor coisa que podemos fazer por nós mesmos, pelas nossas empresas e as outras é contar grandes histórias.